Conflitos de Interesse na Relação Investidor–Assessor no Brasil
Uma análise crítica sobre incentivos, transparência e o futuro da assessoria de Investimentos
Este white paper apresenta uma análise profunda sobre os principais conflitos de interesse que afetam a relação entre investidores pessoa física e os profissionais que os assessoram no Brasil.
O material baseia-se na dissertação de mestrado de Márcio Cezarini Borges (USP/ESALQ, 2023), que utiliza a Teoria da Agência para demonstrar como a estrutura atual de remuneração e os incentivos desalinhados impactam negativamente a qualidade da recomendação e a confiança dos clientes.
Como fundador da Fatorial Investimentos, venho conduzindo estudos constantes sobre modelos internacionais, regulamentações, tendências de comportamento do investidor e, principalmente, formas mais justas e sustentáveis de relacionamento com o cliente.
Foi nesse contexto de pesquisa e transformação interna que me deparei com esta dissertação — e percebi que ela articula, com rigor acadêmico, muitas das reflexões práticas que já vínhamos desenvolvendo dentro da empresa.
Este documento tem o objetivo de compartilhar esses achados com investidores que, como nós, acreditam que transparência, independência e alinhamento devem ser os pilares de qualquer serviço financeiro sério.
Introdução
A confiança é a base da relação entre investidor e profissional financeiro. Contudo, essa confiança é, muitas vezes, operada em silêncio — e sob um sistema que favorece incentivos ocultos e potenciais conflitos de interesse.
Você sabe como seu assessor é remunerado?
Você acredita que a recomendação que recebeu foi pensada 100% para você — ou para bater a meta de alguém?
Essas perguntas são raramente feitas, mas absolutamente necessárias.
1. A Teoria da Agência e o conflito estrutural
O trabalho parte da Teoria da Agência, que analisa relações contratuais entre um principal (quem delega) e um agente (quem executa em nome do principal).
Na assessoria:
O investidor é o principal.
O assessor, o agente.
O problema nasce quando os interesses do agente não estão alinhados com os do principal — especialmente quando o agente é remunerado por terceiros, como plataformas, bancos ou gestores de produtos.
A isso, soma-se a assimetria de informação: o assessor detém conhecimento superior e o investidor, geralmente, não sabe fazer as perguntas certas.
2. As 13 categorias de conflito de interesse
O estudo mapeou conflitos em três eixos principais:
a) Conflitos por remuneração
Recomendação por comissão, não por adequação
Bonificações por volume de vendas
Produtos empurrados por incentivo financeiro
b) Conflitos institucionais
Metas internas de curto prazo
Campanhas promocionais distorcidas
Pressão por rentabilidade de curto prazo
c) Conflitos comportamentais
Viés de familiaridade com produtos
Falta de análise técnica adequada
Representações cognitivamente enviesadas
O resultado: a recomendação perde imparcialidade, e o investidor pode estar sendo conduzido a decisões que não maximizam seu interesse — mas sim o do profissional que o atende.
3. O problema do modelo comissionado
No Brasil, a maioria dos profissionais é remunerada via comissões pagas pelos produtos que distribui. Isso gera os seguintes efeitos:
Foco em produtos que pagam mais, não nos mais adequados
Giro excessivo de carteira
Pouca transparência na relação
Baixa fidelização e foco no curto prazo
Desvalorização do serviço de aconselhamento
Além disso, o cliente muitas vezes não sabe que está pagando, pois os custos estão embutidos no produto.
4. A vulnerabilidade do investidor brasileiro
A pesquisa evidencia que a baixa educação financeira agrava o cenário:
O cliente não entende como o assessor é pago
Não tem base técnica para questionar
Assume a indicação como neutra, quando ela pode ser enviesada
O investidor confia, mas não monitora. E essa confiança cega, somada a incentivos distorcidos, configura o que a Teoria da Agência define como comportamento oportunista do agente.
5. O modelo fee-based como solução
Como alternativa, o estudo propõe a expansão do modelo fee-based, já consolidado em mercados como:
🇺🇸 Estados Unidos (com Registered Investment Advisors)
🇬🇧 Reino Unido (Retail Distribution Review, 2012)
🇦🇺 Austrália (banimento da comissão desde 2013)
No modelo fee-based:
O cliente paga diretamente ao profissional
O valor pode ser fixo ou percentual (ex: 0,3% a 1% ao ano sobre os ativos)
Não há conflito com produtos
A relação se baseia em confiança, e não em venda
Isso permite:
→ Clareza de custos
→ Alinhamento de interesses
→ Atendimento consultivo de longo prazo
→ Maior fidelização e tranquilidade para o cliente
6. Propostas do autor para o futuro
Para transformar a relação entre investidor e assessor no Brasil, Borges propõe:
1. Transparência obrigatória de remuneração
Todo cliente deve saber quem paga o assessor, e quanto.
2. Estímulo à educação financeira prática
Não basta informar: é preciso formar um investidor crítico.
3. Incentivo institucional ao fee-based
Incluindo estímulos fiscais e regulamentares para profissionais e empresas que adotem o modelo.
4. Fiscalização ativa da CVM
Para identificar abusos, conflito de interesses e falta de isenção nas recomendações.
7. Conclusão: confiança só se constrói com alinhamento
O estudo deixa claro: o modelo atual, baseado em comissão, é incompatível com a construção de patrimônio de longo prazo.
Enquanto o assessor depender da venda de produtos para ser remunerado, haverá conflito. E o cliente — por mais bem-intencionado — estará sempre em desvantagem.
O futuro da assessoria passa por:
Modelos transparentes
Remuneração justa
Profissionais realmente independentes
Investidores conscientes e empoderados
Sobre a Fatorial Investimentos
Na Fatorial Investimentos, acreditamos que um bom assessor é aquele que tem tempo, autonomia e estrutura para pensar em você — e apenas em você.
Por isso, estamos em processo de migração para o modelo fee-based, realizando reuniões individuais com nossos clientes para apresentar as mudanças, esclarecer dúvidas e mostrar, com transparência, os benefícios de uma relação mais profissional, previsível e alinhada.
Essa iniciativa nasceu da busca por uma assessoria mais ética, mais moderna e mais próxima das melhores práticas globais — reforçada pela leitura crítica da dissertação de Márcio Borges e por nossa própria experiência no relacionamento com milhares de investidores nos últimos anos.
Sobre o autor
Márcio Cezarini Borges é mestre em Administração pela USP/ESALQ. Sua dissertação foi orientada por André Felipe Zorzi Alves, com banca composta por Cláudio Roberto Tavares e Alexandre Assaf Neto. O trabalho foi aprovado com distinção em março de 2023.
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